Ensaios sobre a vida: Temos uma vida só

I A vida é curta
II Temos uma vida só
III A vida é feita de momentos
IV E agora, como viveremos?
V As coisas velhas se passam; tudo se faz novo

TEMOS UMA VIDA SÓ

Mentiram a você. Não teremos outra vida. Seremos, para sempre, assim. Um poço de lamúria, mentira, presunção. Todo legado e reputação de cada ser humano se fragilizariam acaso ficassem as claras, intenções e ações às surdinas. Não ficaria pedra sobre pedra. Do mais santo ao mais promíscuo, a carne - a dita cuja - encarcera e esconde a alma emporcalhada.

A vida é o palco da arte cênica da dissimulação.

”Sede santo porque eu sou santo.” Os santos morreriam de tristeza e vergonha com suas vísceras expostas ao julgamento púbico. Um vexame fatal e suicidante. Os promíscuos morreriam de tanta honestidade e orgulho de suas gônadas inflamadas e não resistiriam aos seus venenos que logo desencadeariam os óbvios óbitos. Mas há uma saída [escape religioso]. A alma inclemente confia na expectação da catarse espiritual, porém, ninguém se esqueça:

A vida é o palco da arte cênica da dissimulação.

Ninguém se acha suficiente para salvar-se do inferno dantesco e habitar no glorioso e gloriado céu. Como cordeirinhos enfileirados, milhares iniciam sua romaria rumo à cruz do calvário – a apoteose milenar da tradição cristã; onde todos são alcançados pelo Salvador que tira o pecado do mundo com direito ao drive-thru e coletor de pedágios na via dolorosa...

Todos nós temos a certeza de quem somos e de que pouco valemos, mas a maioria ignora este fato e então posam de véu e grinalda como noiva do Senhor. Um anjo me contou que diante do grande trono branco existe uma peneira em tamanho “GG cósmico” onde Deus lavou os escolhidos com sangue fervendo a fim de eliminar toda dissimulação e que para eliminar o orgulho pastoral, teve de ferver sete vezes mais.

Deus nos salvou por aquilo que ninguém viu em nós, nem nós mesmos, porque se tivéssemos visto, adulteraríamos em fração de segundos. O grande sacrifício eterno aconteceu e o que menos se precisa é a validação e o direcionamento de sua abrangência dirigida pelo ser humano. O curso do ‘sangue que tira o pecado’ acontece no solo interior e intrínseco de cada um. Louco é quem julga; só Deus “conhece a ti mesmo”. Nós apenas nos conhecemos em parte; e a parte ruim.

Mas voltando ao assunto inicial, podem ficar tranqüilos. Seremos os mesmos, mas haveremos de ser transformados por completo.